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16 de Abril de 2024
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    É inconstitucional o fim da propaganda partidária gratuita no rádio e na TV

    Publicado por Douglas Barreto
    há 6 anos

    Dentre as inúmeras mudanças provocadas pela última reforma eleitoral, consubstanciada nas leis 13.487 e 13.488 de 2017, não há dúvidas de que a mais polêmica foi a criação do fundo especial para o financiamento de campanha (FEFC), objetivando o financiamento de campanhas eleitorais com dinheiro público, por meio da inclusão do artigo 16-C à lei 9.504 de 1997.

    De acordo com a redação dada pela Lei 13.487/2017, a União deverá destinar ao FEFC i) 30% dos recursos reservados às emendas parlamentares das bancadas estaduais, bem como ii) um valor, a ser definido pelo TSE, “equivalente à somatória da compensação fiscal que as emissoras comerciais de rádio e televisão receberam pela divulgação da propaganda partidária” efetuadas em 2017 e 2016, devendo tal valor ser atualizado, a cada eleição, pelo índice INPC (artigo 3º). Para isso, foi necessário extinguir a propaganda partidária no rádio e na televisão (artigo 5º).

    A propaganda partidária constitui espécie do gênero propaganda política, sendo que este ainda engloba a propaganda eleitoral, a propaganda intrapartidária e a propaganda institucional. Sendo assim, a propaganda partidária distingue-se das demais por ter como finalidade específica a difusão da ideologia do partido político. Nas palavras de Olivar Coneglian:

    “A propaganda político-partidária busca discutir temas sociais, programas ou metas do partido e tem o objetivo de conquistar simpatias para as cores partidárias ou para posições tomadas pelo partido em relação a questões sociais, políticas, filosóficas, econômicas, trabalhistas[1].

    É importante pontuar, ademais, que a veiculação de propaganda política — e, especificamente, da propaganda partidária gratuita — visa a concretizar o ideal de Estado Democrático de Direito delineado pela Constituição de 1988. A verdadeira observância ao pluralismo político (artigo 1, V, CRFB) e à legitimidade de um governo representativo pressupõe o enriquecimento do debate eleitoral e a participação consciente dos cidadãos, o que apenas se conquista através da informação proporcionada pela propaganda. Ainda, o caráter gratuito, intrínseco ao direito de antena, vem a afastar a influência do poder econômico do jogo democrático.

    Não é por outra razão, portanto, que o acesso gratuito ao rádio e à televisão pelas agremiações partidárias, o "direito de antena", foi elevado ao status constitucional pelo constituinte originário. A redação primária do artigo 17, § 3º, da CRFB, previa taxativamente: “os partidos políticos têm direito a recursos do fundo partidário e acesso gratuito ao rádio e a televisão, na forma da lei”.

    Apesar da recente EC 97/2017, de 4.10.2017, ter alterado a disposição citada para prever uma espécie de cláusula de barreira para o direito de antena, este ainda é expressamente assegurado pelo texto constitucional. É verdade, ademais, que a constitucionalidade da referida Emenda Constitucional é questionável, em razão de uma possível violação à igualdade partidária e ao pluralismo político, que são cláusulas pétreas (artigo 60, § 4º , IV, CRFB), mas este não é o objetivo do presente artigo.

    É, assim, a atual redação do 17, § 3º, da CRFB:

    § 3º Somente terão direito a recursos do fundo partidário e acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da lei, os partidos políticos que alternativamente:

    I - obtiverem, nas eleições para a Câmara dos Deputados, no mínimo, 3% (três por cento) dos votos válidos, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação, com um mínimo de 2% (dois por cento) dos votos válidos em cada uma delas; ou

    II - tiverem elegido pelo menos quinze Deputados Federais distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação.

    Desta forma, é inconteste que a Lei 13.487/2017 violou o direito constitucional de antena dos partidos políticos ao extinguir a propaganda partidária gratuita no rádio e na televisão. Esse entendimento, ademais de toda a questão de fundo já exposta, também está em consonância com os precedentes do Supremo Tribunal Federal sobre o tema.

    No julgamento da ADI 3.551, ocorrido em 7.12.2006, o STF analisou a constitucionalidade de lei que alterou dispositivos da lei 9.096 e instituiu uma espécie de "cláusula de barreira", condicionando a fruição do direito de antena ao desempenho partidário em eleições.

    Na oportunidade, com embasamento na ideia de igualdade entre os partidos, de proteção às minorias partidárias e no pluripartidarismo, ficou assentado que "surge conflitante com a Constituição Federal lei que, em face da gradação de votos obtidos por partido político, afasta o funcionamento parlamentar e reduz, substancialmente, o tempo de propaganda partidária gratuita e a participação no rateio do fundo partidário [...]".

    Ainda, no julgamento conjunto das ADI 4.430 e 4.795, discutiu-se a constitucionalidade de lei que usava a representação na Câmara dos Deputados como parâmetro para a distribuição do tempo de propaganda eleitoral gratuita, excluindo do rateio aquelas agremiações que não tinham deputados federais eleitos.

    O ministro Toffoli, relator das ações, assentou, em seu belíssimo voto, dentre outras razões, a importância dos partidos políticos para o modelo de democracia brasileiro, pontuando i) o direito de antena como “indispensável à existência e ao desenvolvimento dos partidos políticos”, uma vez que o rádio e a televisão continuam sendo as principais vias de comunicação social da nação; e ii) a eficácia imediata do artigo 17, , da CRFB, por não se tratar de norma constitucional de eficácia limitada, mas de um direito das agremiações partidárias reconhecido pelo constituinte originário. Deste modo, a norma foi declarada inconstitucional.

    Assim, depreende-se dos precedentes citados que o nosso Supremo Tribunal Federal vem, sucessivamente, afirmando a importância e amplitude do direito constitucional de antena frente aos intentos do legislador ordinário de afastá-lo ou suprimi-lo. Ainda, extrai-se a importante lição de que o direito de antena compreende a veiculação de propaganda partidária e da propaganda eleitoral, e não de uma ou outra — o que não poderia ser diferente.

    Segundo as lições do Professor José Jairo Gomes “a propaganda eleitoral distingue-se da partidária, pois, enquanto esta se destina a divulgar o programa e o ideário do partido político, a eleitoral enfoca os projetos dos candidatos com vistas a atingir um objetivo prático e bem definido: o convencimento dos eleitores e a obtenção de vitória no certame”[2].

    Sendo assim, tendo em vista as diferentes finalidades de cada espécie da propaganda, ambas são indispensáveis à efetivação do nosso modelo democrático e intrínsecas ao direito de antena. Frisa-se que, com a drástica redução do tempo de campanha eleitoral, que diminuiu de 90 para 45 dias, com uma propaganda eleitoral de apenas 35 dias, a veiculação da propaganda partidária ganha ainda mais importância no fomento ao debate político.

    Por fim, quanto à criação do “fundão”, já há a Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.795, de relatoria da ministra Rosa Weber, em trâmite no STF. Entretanto, a violação ao direito de antena não foi um dos argumentos levantados pelo autor da ação, o Partido Social Liberal (PSL), que se ateve às questões orçamentárias envolvidas. Sendo assim, espera-se que o presente artigo possa vir a contribuir com o debate sobre a matéria e, quem sabe, auxiliar na preservação do modelo democrático desenhado pela nossa Constituição. Até porque, sabemos, os magistrados têm o dever de ofício de declarar uma inconstitucionalidade. Esperemos.

    fonte: conjur

    Autor: Anna Paula Oliveira Mendes

    • Sobre o autorAdvogado, Pós-graduando em Direito Processual Penal e corresponde jurídico
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